A Comunhão na mão no primeiro milênio da Igreja
Alguns grupos católicos e influenciadores (nas redes sociais) estão difundindo entre os fiéis menos advertidos a noção de que a Comunhão na mão seria praticamente um sacrilégio.
Bem, se essa ideia for verdade, teremos que dizer que os Apóstolos e a Igreja foram desrespeitosos com a Sagrada Eucaristia ao longo de mil anos! Você acha que faz sentido afirmar uma coisa dessas?
Sim, porque, por padrão, a Santa Hóstia era entregue somente na mão, ao menos nos nove primeiros séculos.
São numerosos os escritos dos Padres antigos que comprovam que a Comunhão era dada na mão. Por exemplo:
- Santo Agostinho (Contra ep. Parmen., II,7,13);
- Teodoro de Mopsuéstia (Sermões Catequéticos IV);
- São João Crisóstomo (Homilia 47);
- Cirilo de Jerusalém (Catequeses Mistagógicas de Jerusalém, V 21s);
- Tertuliano (De idolol. c.7);
- Dionísio de Alexandria (em Eusébio, Hist. Eclesiástica VII,9,4);
- Papas Cornélio a Fábio (em Eusébio, Hist. Eclesiástica VI,43,18).
Essas instruções antigas incluíam a orientação de fazer um “trono” com as mãos, colocando uma sobre a outra, e o alerta para que se tome o cuidado para que não se perca nenhuma migalha do precioso Pão.
Inclusive, na planta das grandes basílicas antigas, havia uma fonte no átrio. As evidências indicam que não tinha mera função decorativa, mas serviam à necessidade de os leigos lavarem as mãos antes de receberem a Comunhão.
COMO A COMUNHÃO NA BOCA FOI INTRODUZIDA?
Acontece que, quanto mais a Igreja crescia em número de fiéis, menos podia se certificar da “qualidade” e da boa intenção dos que entravam nas igrejas. Começaram a haver casos de sacrilégio, de pessoas que recebiam a Hóstia e não a consumiam logo em seguida.
Somado a isso, houve no século 9 o início da introdução do pão ázimo, em substituição ao pão com fermento. Os fragmentos do pão ázimo são mais tenros e finos, então considerou-se que era mais conveniente e respeitoso colocar a Hóstia diretamente na língua.
E assim o costume da Comunhão na boca foi se difundindo, mas só se tornou regra geral no Ocidente no século 11.
A LEI DA IGREJA SOBRE A COMUNHÃO NA BOCA, HOJE
E hoje, como é a lei disciplinar da Igreja a esse respeito? Veja:
Todo fiel tem sempre direito a escolher se deseja receber a sagrada Comunhão na boca ou se, o que vai comungar, quer receber na mão o Sacramento. (Instrução Redemptionis Sacramentum, 92)
Esse “direito” de escolha só é suspenso em caso de perigo de profanação (em missas campais, por exemplo), em que se deve distribuir a Comunhão somente na boca dos fiéis… Ou se a Comunhão for em duas espécies, pois: “Não se permita ao comungante molhar por si mesmo a hóstia no cálice, nem receber na mão a hóstia molhada” (Instrução RS, 104).
Pessoalmente, prefiro receber a Comunhão na boca. Agora, se por algum motivo isso não for possível, recebo com toda a tranquilidade o Corpo de Cristo na mão, e cuido (com zelo, mas sem neura) de consumir as partículas visíveis.
Grupos que se colocam em aberto confronto com a lei disciplinar da Igreja e demonizam a Comunhão na mão estão espalhando confusão, infundindo nos corações a desconfiança contra as autoridades de Roma e favorecendo o desenvolvimento de neuroses nas pessoas mais sensíveis.
Se a Igreja, Mãe e Mestra, permite a Comunhão na mão, por que tanta contestação? No fundo, toda essa polêmica só serve para nos distrair do essencial na vivência da fé!
As informações históricas deste artigo podem ser encontradas no livro Missarum Sollemnia, do padre Jungmann.
Fonte: O Catequista