Palavra de Deus: fonte de vida, amor e esperança
Dom Manoel Ferreira dos Santos Junior
Bispo de Registro
Que a Bíblia é a Palavra de Deus, todos nós sabemos. Que quando lemos ou ouvimos a Sagrada Escritura é o próprio Deus que nos fala, isso também os cristãos têm consciência. Que na Celebração Eucarística ou na Celebração da Palavra, a Bíblia fala para todos e ao mesmo tempo para cada um, conforme sua realidade, seu sofrimento e suas alegrias, nós já experimentamos.
O que desejo salientar neste texto, é o quanto a Palavra de Deus se torna novidade, quando nos abrimos a ela: o texto lido e relido muitas vezes sempre traz em si novidade profunda e transformadora em nossa vida. Digo isso, a partir de uma experiência que fiz nestes dias.
Neste tempo de pandemia e isolamento social, nossa Diocese realizou seu primeiro retiro virtual. Já havíamos feito muitas reflexões e formações virtuais, mas, retiro foi o primeiro. O pregador foi o padre Rubens Pedro, presidente da CRB (Conferência dos Religiosos do Brasil), de São Paulo. No último dia do retiro, ele nos orientou a refletir sobre os três primeiros capítulos do Apocalipse de São João, onde estão as cartas às Sete Igrejas. Recordava que o texto é uma mensagem que se dirige a todas as comunidades cristãs do passado, do presente e do futuro. Dizia ainda que Cristo passeia pelos sete candelabros de ouro, para mostrar o valor de cada comunidade e ao mesmo tempo, entendi que as comunidades podem ser as comunidades e as pessoas onde Cristo se faz presente, valorizando a nossa história.
Devo dizer que, muitas, vezes, já tinha lido o Apocalipse e que já havia dado aulas de formação sobre ele. Porém, desta vez, fui surpreendido pela profundidade do texto que mostra, nas Cartas às comunidades, elogios e correções.
A primeira mensagem é para a Igreja de Éfeso e diz assim: “conheço as suas obras, o seu trabalho árduo e a sua perseverança. Sei que você não pode tolerar homens maus, que pôs à prova os que dizem ser apóstolos, mas não são, e descobriu que eles eram impostores. Você tem perseverado e suportado sofrimentos por causa do meu nome e não tem desfalecido. Contra você, porém, tenho isto: você abandonou o seu primeiro amor” (Cf. Ap. 2, 2-4). Ao ler esta primeira mensagem, percebi que precisamos voltar sempre ao primeiro amor. É ele que dá o sentido de nossa vida e de nossa vocação. Sem ele, perdemos o entusiasmo de viver. Às vezes, somos perseverantes, mas sem alegria ou entusiasmo na missão. Isso serve para nossas comunidades e para nossa vida pessoal. Cristo pede que voltemos ao primeiro amor de nossa vida.
A segunda mensagem é para a Igreja em Esmirna e diz: “Conheço as suas aflições e a sua pobreza; mas você é rico! Não tenha medo do que você está prestes a sofrer. O Diabo lançará alguns de vocês na prisão para prová-los, e vocês sofrerão perseguição durante dez dias. Seja fiel até a morte, e eu lhe darei a coroa da vida” (Cf. Ap, 2, 9-10). A partir desta mensagem, pensei na riqueza que existe na vida das pessoas e das comunidades, mas pela baixa estima ou medo de perseguição, muita gente se esmorece ou abandona a fé. Cristo pede apenas nossa fidelidade a amor.
A terceira mensagem, dirigida à Igreja em Pérgamo, fala: “Sei onde você vive – onde está o trono de Satanás. Contudo, você permanece fiel ao meu nome e não renunciou à sua fé em mim, nem mesmo quando Antipas, minha fiel testemunha, foi morto nessa cidade, onde Satanás habita. No entanto, tenho contra você algumas coisas: você tem aí pessoas que se apegam aos ensinos de Balaão” (Cf. Ap.2,13-14). Lembrei-me dos ídolos que vamos criando em nossa vida. Trocamos o Deus verdadeiro, por ídolos que nos escravizam e nos fazem sofrer. Cristo pede que adoremos o Deus verdadeiro, em Espírito e em verdade.
A Igreja em Tiatira é a destinatária da quarta mensagem: “Conheço as suas obras, o seu amor, a sua fé, o seu serviço e a sua perseverança, e sei que você está fazendo mais agora do que no princípio. No entanto, contra você tenho isto: você tolera Jezabel, aquela mulher que se diz profetisa. Com os seus ensinos, ela induz os meus servos à imoralidade sexual e a comerem alimentos sacrificados aos ídolos” (Cf. Ap, 2, 19-20). Vejamos o quanto temos “Jezabel” em nossa vida. Ela atrapalha nosso crescimento, nos prende às nossas paixões e não nos deixa livres para melhor servir a Jesus Cristo. Cristo pede que continuemos a crescer na fidelidade.
A quinta mensagem é para a Igreja em Sardes: “Estas são as palavras daquele que tem os sete espíritos de Deus e as sete estrelas. Conheço as suas obras; você tem fama de estar vivo, mas está morto.” (Cf. Ap. 3, 1ss). Pensei nas pessoas que vivem no farisaísmo. Falam de Cristo, mas vivem longe dele, falam de oração e de amor, mas não vivem o que pregam. Nem sempre percebem que estão mortos por dentro. Cristo pede apenas que vivamos Nele.
A sexta mensagem, para a igreja em Filadélfia: “Conheço as suas obras. Eis que coloquei diante de você uma porta aberta que ninguém pode fechar. Sei que você tem pouca força, mas guardou a minha palavra e não negou o meu nome” (Cf. Ap. 3, 8). Recordei-me das pessoas fracas, frágeis e limitadas, mas que procuram perseverar na fé, não abandonam Jesus Cristo e enfrentam as dificuldades por pura graça de Deus. Cristo pede que em nossa fraqueza, lembremos que Ele é a nossa força.
A sétima mensagem se reporta à igreja em Laodiceia: “Conheço as suas obras, sei que você não é frio nem quente. Melhor seria que você fosse frio ou quente! Assim, porque você é morno, não é frio nem quente, estou a ponto de vomitá-lo da minha boca. Você diz: ‘Estou rico, adquiri riquezas e não preciso de nada’. Não reconhece, porém, que é miserável, digno de compaixão, pobre, cego, e que está nu” (Cf. Ap. 3, 15-17). Tantos se acham ricos, mas como diz santa Dulce dos Pobres, “só tem dinheiro e mais nada”. Cristo pede que busquemos a verdadeira riqueza está em Deus e em realizar sua santa vontade acima de tudo.
Que neste mês de setembro, a Palavra de Deus toque o nosso coração e nos anime a sermos mais cristãos a serviço da vida, do amor e da esperança.